quarta-feira, 28 de fevereiro de 2018

Ação de Matriciamento com Agentes Indígenas do PSFI da Coroa Vermelha

terça-feira, 27 de fevereiro de 2018

Posicionamento da WPA sobre Espiritualidade e Religiosidade em Psiquiatria

Foi publicado no site da  ABP - Assoc. Bras. de Psiquiatria, a versão em português do "Posicionamento da Associação Mundial de Psiquiatria (WPA) sobre Espiritualidade e Religiosidade em Psiquiatria". Recomenda diretrizes para a adequada inclusão da religiosidade/espiritualidade  na psiquiatria: na pesquisa, ensino e prática clínica.
www.abp.org.br/portal/posicionamento-da-wpa-sobre-espiritualidade-e-religiosidade-em-psiquiatria/

Posicionamento da WPA sobre Espiritualidade e Religiosidade em Psiquiatria

PUBLICADO EM 26 DE FEVEREIRO DE 2018

Facebook

Google+

LinkedIn

WhatsApp

Posicionamento da Associação Mundial de Psiquiatria (WPA) sobre Espiritualidade e Religiosidade em Psiquiatria

Seção de Religião, Espiritualidade e Psiquiatria da WPA

A Associação Mundial de Psiquiatria (WPA) e a Organização Mundial da Saúde (OMS) trabalham arduamente para garantir que a promoção e os cuidados em saúde mental sejam baseados cientificamente e, ao mesmo tempo, compassivos e com sensibilidade cultural1,2. Nas últimas décadas, tem havido uma crescente conscientização da academia e da população geral sobre a relevância da religião e da espiritualidade nas questões de saúde. Revisões sistemáticas da literatura científica identificaram mais de 3.000 estudos empíricos investigando as relações entre religião / espiritualidade (R/E) e saúde3,4.

No campo dos transtornos mentais, demonstrou-se que R/E têm implicações significativas para prevalência (especialmente em transtornos depressivos e por uso de substâncias), diagnóstico (ex.: diferenciação entre experiências espirituais e transtornos mentais), tratamento (ex.: comportamento de busca de tratamento, aderência, mindfulness, terapias complementares), desfechos clínicos (ex.: melhora clínica, e suicídio ) e prevenção, bem como para a qualidade de vida e bem-estar3,4. A OMS já inclui R/E como uma dimensão da qualidade de vida5. Embora haja evidências mostrando que R/E estão geralmente associadas a melhores desfechos de saúde, elas podem também causar danos (ex.: recusa de tratamento, intolerância, coping religioso negativo, etc.). Pesquisas mostraram que valores, crenças e práticas relativas a R/E se mantêm relevantes para a maior parte da população mundial e que pacientes gostariam de ter suas questões em R/E abordadas nos cuidados em saúde6-8.

Psiquiatras precisam levar em conta todos os fatores que afetam a saúde mental. Evidências mostram que R/E devem ser incluídas entre estes, independentemente da orientação espiritual, religiosa ou filosófica dos psiquiatras. No entanto, poucas escolas médicas ou currículos de especialidade fornecem qualquer treinamento formal para psiquiatras aprenderem sobre a evidência disponível ou como abordar adequadamente a R/E tanto na pesquisa quanto na prática clínica7,9.

Para preencher esta lacuna, a WPA e várias outras associações nacionais de psiquiatria (ex.: Brasil, Índia, África do Sul, Reino Unido e EUA) criaram seções em R/E. A WPA incluiu “religião e espiritualidade” como parte do “Curriculum Básico de Treinamento em Psiquiatria”10.

Ambos termos, religião e espiritualidade, carecem de uma definição universalmente aceita. Definições de espiritualidade geralmente se referem a uma dimensão da experiência humana relacionada com o transcendente, o sagrado, ou a realidade última. Espiritualidade está intimamente relacionada com os valores, o significado e o propósito de vida. Espiritualidade pode se desenvolver individualmente ou em comunidades e tradições. Religião é frequentemente vista como o aspecto institucional da espiritualidade, geralmente definida mais em termos de sistemas de crenças e práticas relacionadas com o sagrado ou divino, realizada por uma comunidade ou grupo social3,8.

Independentemente de definições precisas, a espiritualidade e a religião lidam com as crenças fundamentais, valores e experiências dos seres humanos. Portanto, a consideração da sua relevância para as origens, a compreensão e o tratamento dos transtornos psiquiátricos bem como para a atitude do paciente frente à doença deveria estar no centro da psiquiatria acadêmica e clínica. Considerações espirituais e religiosas também têm implicações éticas significativas para a prática clínica da psiquiatria11 . Em particular, a WPA propõe que:

1. Uma consideração cuidadosa das crenças e práticas religiosas dos pacientes, bem como a sua espiritualidade, deveriam ser abordadas rotineiramente sendo, por vezes, um componente essencial da coleta da história psiquiátrica.

2. A compreensão da religião e da espiritualidade e sua relação com o diagnóstico, etiologia e tratamento de transtornos psiquiátricos devem ser consideradas como componentes essenciais tanto da formação psiquiátrica como do contínuo desenvolvimento profissional.

3. Há uma necessidade de mais pesquisas sobre religião e espiritualidade em psiquiatria, especialmente sobre suas aplicações clínicas. Estes estudos devem abranger uma ampla diversidade de contextos culturais e geográficos.

4. A abordagem da religião e da espiritualidade deve ser centrada na pessoa. Psiquiatras não devem usar sua posição profissional para fazer proselitismo de visões de mundo seculares ou espirituais. Psiquiatras devem sempre respeitar e ser sensíveis às crenças e práticas espirituais / religiosas de seus pacientes, das famílias e cuidadores de seus pacientes.

5. Os psiquiatras, sejam quais forem suas crenças pessoais, devem estar dispostos a trabalhar com líderes / membros de comunidades religiosas, capelães e agentes pastorais, bem como outros membros da comunidade, em suporte ao bem-estar de seus pacientes e devem incentivar seus colegas multidisciplinares a fazerem o mesmo.

6. Os psiquiatras devem demonstrar consciência, respeito e sensibilidade para o importante papel que a espiritualidade e religiosidade podem desempenhar para muitos funcionários e voluntários na formação de uma vocação para trabalhar no campo dos cuidados em saúde mental.

7. Os psiquiatras devem estar cientes tanto do potencial benéfico quanto prejudicial das práticas e visões de mundo religiosas, espirituais e seculares e estarem dispostos a compartilhar essas informações de forma crítica e imparcial com a comunidade em geral, em apoio à promoção da saúde e bem-estar.

Alexander Moreira-Almeida1,2, Avdesh Sharma1,3, Bernard Janse van Rensburg1,4, Peter J. Verhagen1,5, Christopher C.H. Cook1,6

1 Seção de Religião, Espiritualidade e Psiquiatria da WPA;

2 NUPES, Núcleo de Pesquisa em Espiritualidade e Saúde, Universidade Federal de Juiz de Fora, Brasil;

3 ‘Parivartan’ Center for Mental Health, New Delhi, India;

4 Department of Psychiatry, University of the Witwatersrand, Johannesburg, South Africa;

5 GGZ Centraal, Harderwijk, the Netherlands;

6 Department of Theology and Religion, Durham University, Durham, UK.

Agradecimentos
Os autores agradecem a todos que contribuíram durante o processo de elaboração deste Posicionamento, em especial, a D. Bhugra, R. Cloninger, J. Cox, V. De Marinis, J.J. Lopez Ibor (in memoriam), D. Moussaoui, N. Nagy, A. Powell, H.M. van Praag e MF Peres. Este posicionamento se utilizou de partes do texto de recomendações já publicadas no Posicionamento do Royal College of Psychiatrists11. Versão em português traduzida por Mario F. Peres e revisada por Alexander Moreira-Almeida,

Referências
1. Bhugra D. The WPA Action Plan 2014-2017. World Psychiatry 2014; 13:328.

2. Saxena S, Funk M, Chisholm D. WHO’s Mental Health Action Plan 2013-2020: what can psychiatrists do to facilitate its implementation? World Psychiatry 2014; 13:107-9.

3. Koenig H, King D, Carson VB. Handbook of religion and health. 2nd edition. New York: Oxford University Press, 2012.

4. Koenig HG, McCullough ME, Larson DB. Handbook of religion and health. 1st edition. New York: Oxford University Press, 2001.

5. WHOQOL SRPB Group. A cross-cultural study of spirituality, religion, and personal beliefs as components of quality of life. Social Science and Medicine 62:1486-1497, 2006.

6. Pargament KI, Lomax JW. Understanding and addressing religion among people with mental illness. World Psychiatry. 2013; 12(1):26-32.

7. Moreira-Almeida A, Koenig HG, Lucchetti G. Clinical implications of spirituality to mental health: review of evidence and practical guidelines. Rev Bras Psiquiatr. 2014; 36(2):176-82.

8. Verhagen PJ, Van Praag HM, Lopez-Ibor JJ, Cox J, Moussaoui D. (Eds.) Religion and psychiatry: beyond boundaries. Chichester: John Wiley & Sons, 2010.

9. Cloninger CR. What makes people healthy, happy, and fulfilled in the face of current world problems? Mens Sana Monographs 2013; 11:16-24.

10. World Psychiatric Association. Institutional program on the core training curriculum for psychiatry. Yokohama, Japan, August 2002. Available at: www.wpanet.org/uploads/Education/Educational_Programs/Core_Curriculum/corec urriculum-psych-ENG.pdf

11. Cook CCH. Recommendations for psychiatrists on spirituality and religion. Position Statement PS03/2011, London, Royal College of Psychiatrists, 2011. Available (in a later edition) at http://www.rcpsych.ac.uk/pdf/PS03_2013.pdf

Proposto pela seção de Religião, Espiritualidade e Psiquiatria da WPA Aprovado pelo comitê executivo da WPA em 09/2015

Publicado como: Moreira-Almeida A, Sharma A, van Rensburg BJ, Verhagen PJ, Cook CC. WPA Position Statement on Spirituality and Religion in Psychiatry. World Psychiatry. 2016 Feb;15(1):87-8.

Acesse aqui o texto original (inglês) publicado no site da WPA.

Associação Brasileira de Psiquiatria. Todos os direitos reservados. 2011
Fone/Fax: +55 (21) 2199-7500)

domingo, 11 de fevereiro de 2018

O Outro Lado da Informação POR JOEL RENNÓ

O Outro Lado da Informação
POR JOEL RENNÓ

09/02/2018, 22h53   
Sob a égide do vale tudo em obras de ficção científica, a novela “O Outro Lado do Paraíso” da TV Globo vem tratando de temas  das áreas de psicologia e psiquiatria de forma extremamente superficial e inconsistente. E a cada dia se supera em mediocridade e falta de embasamento para o tratamento de assuntos complexos.

Primeiramente, apresentaram a psiquiatria atual como se ainda tivéssemos os terríveis manicômios com tratamentos desumanos e mostrando um procedimento médico como a ECT (eletroconvulsoterapia) -usado com segurança e vários cuidados anestésicos, clínicos e humanos nos dias atuais -, de forma dantesca, literalmente a seco. A ECT é um tratamento extremamente seguro, eficaz e aprovado em protocolos médicos internacionais para quadros graves de depressão, transtorno bipolar e esquizofrenia. E para piorar o psiquiatra da trama agiu de forma corrupta até roubando drogas psicotrópicas do hospital onde trabalha para simular um quadro psicótico na mocinha da história e fez um laudo médico falso. Isso tudo em uma área muito estigmatizada e repleta de preconceitos e desinformações que é a área de psiquiatria.

Agora colocaram erroneamente o coaching (que eu respeito) como sendo uma técnica que poderia ajudar a diagnosticar e tratar até traumas psicológicos sérios como o do dramático abuso sexual infantil. E na trama as sessões foram realizadas por uma advogada que através da hipnose levou uma jovem às memórias de abuso por parte do padrasto. Simples assim em um passe de mágica….

No início dos anos 80, uma série de crimes chocou os EUA. Dezenas de mulheres começaram a relatar abusos sexuais sofridos na infância. Essas lembranças sempre afloravam no consultório de algum psicólogo, depois que as moças tinham passado por sessões de terapia com técnicas de hipnose e regressão. O FBI resolveu investigar o caso e descobriu que os abusos eram falsas memórias, que haviam sido acidentalmente induzidas por psicólogos durante sessões de hipnose. As memórias falsas  podem ser induzidas inclusive por profissionais da psicologia – imaginem por um coach que geralmente nem tem formação na área de psiquiatria ou psicologia.

A memória não é um registro da realidade – é uma interpretação construída pela mente. O nosso cérebro inventa o mundo, das cores que a gente vê às experiências que a gente vive. E edita essas informações antes de gravá-las. Cientistas da Universidade Harvard descobriram que os mecanismos que usamos para acessar nossas memórias são os mesmos que usamos para imaginar as coisas. Uma pessoa pode ter lembranças erradas ao ler o que está gravado corretamente na sua memória.

Todos nós temos lembranças falsas ou distorcidas.  Já que a memória e a imaginação usam os mesmos mecanismos, a mente não vê problema em dar uma inventadinha para completar as lacunas.

Bizarro foi ver que as lembranças suscitadas em apenas uma ou duas sessões de hipnose nessa condição foram suficientes para levar à acusação de pedofilia contra o padrasto com denuncia imediata à Delegacia para punir o agressor.

Entendo que uma ficção científica não tenha compromisso com a realidade, mas quando uma teledramaturgia se propõe a discutir temas sociais e da área de saúde complexos uma ampla e detalhada pesquisa ou consultoria precisa ser realizada. E muitos telespectadores se baseiam nas “verdades” ditas pelas novelas que acabam implementando conhecimentos médicos sérios de forma totalmente distorcida. Aí torna-se um desserviço e muitas novelas globais, ao contrário da atual, já receberam inclusive prêmios internacionais relevantes por uma pesquisa embasada dentro de temas da área de saúde mental. Vale a reflexão e a correção dos rumos errados até aqui.